Atrás de mim virá, quem bom me fará.
6 anos volvidos, o investimento público efectivamente executado de Passos Coelho, mesmo numa conjuntura de intervenção pela "troika", continua uma miragem inatingível para a esquerda.
Por vezes preciso de escrever uns textos que me ajudam a compreender e registar o que me rodeia. Sem uma racionalidade sobre as coisas sinto-me como uma folha no vento.
Hoje tentei encontrar uma explicação para a maioria dos portugueses preferir manter um governo mentiroso, (até para os seus parceiros de coligação), e incompetente.
Ricardo Araújo Pereira, no "Isto é gozar com quem trabalha", entrevista Ana Catarina Mendes, líder parlamentar do Partido Socialista):
RAP: "Num ano em que o país foi devastado por uma pandemia, em que milhares de pessoas perderam o emprego, vários sectores económicos viram a sua actividade reduzida a zero, e o SNS foi levado até ao limite, o governo não gastou todo o dinheiro que o orçamento previa. Estão a poupar para quê, para uma emergência, ou assim?"
ACM: "Até isso não é francamente correcto. Pronto, lá está. Nós, no orçamento suplementar, por exemplo, primeiro o Estado português fez todos os esforços financeiros para dar resposta às pessoas e à manutenção do emprego, para protecção social, com a criação de novas prestações sociais que abrangem já hoje muita, muita gente que ficou sem rigorosamente... Há sectores, como o sector da cultura, o sector da restauração, que foram sectores muito, muito afectados, e, por exemplo, em relação ao orçamento suplementar, onde estavam 500 milhões para o Serviço Nacional de Saúde e para o reforço do Serviço Nacional de Saúde, foram gastos 685 milhões. Portanto, não ficou aquém, ficou até superior. Em termos das despesas com a COVID na área social, também ficou muito... gastámos muito mais que aquilo que era suposto. Ou seja.. despesistas para acudir às pessoas, despesistas para que as pessoas não morram, despesistas para que as pessoas não morram de fome, e despesistas para garantir que a seguir a esta pandemia há um trabalho muito grande para fazer, designadamente no combate às desigualdades. Por isso, eu não diria como o Ricardo que o ministro das finanças está a fazer uma má gestão orçamental: está a fazer uma gestão orçamental que permite responder neste momento a todos os problemas, aliás já disse também, ontem e hoje, numa entrevista, que não deixará de haver dinheiro e que colocará todo o dinheiro que for necessário para combatermos esta pandemia, e também convém que haja futuro, e que haja dinheiro também para garantirmos que há uma reconstrução do país a seguir."
A (falta de) resposta chegará para alguns, mais de 50%, segundo as últimas sondagens. Aqueles que não se importam de comer gelados com a testa, anestesiados (ou não) com a pandemia.
Outros preferem consultar os rácios de execução dos orçamentos de Estado dos últimos anos, como o Joaquim Miranda Sarmento, presidente do conselho estratégico nacional do PSD (ler “A farça orçamental continua… mesmo em tempos de pandemia” e “Ainda a farça orçamental“):
"(...) A despesa total executada ficou abaixo do previsto no OE inicial. Sim caro leitor, ficou abaixo do OE antes da pandemia. E, como tal, ficou muito abaixo do previsto no OE retificativo. O que comprova a brutal farsa que foi o OE retificativo. Serviu apenas para aumentar o teto do endividamento (porque houve menos receita, sobretudo fiscal).
O Governo colocou mais despesa apenas para voltar a enganar a extrema-esquerda. Não tinha qualquer intenção de executar essa despesa adicional, apesar da enorme necessidade que o SNS, as famílias e as empresas têm de apoios. Uma farsa levada ao extremo! Mas com custos sociais e económicos terríveis. (...)
Desde o OE2016 que assistimos a uma farsa orçamental. O Governo coloca no papel do OE um número em matéria de despesa e depois avança com uma execução completamente diferente.
Isso foi sobretudo visível no investimento público. Houve sempre grandes promessas de investimento por parte do Estado – havia que contentar a extrema-esquerda que foi aprovando os OE – mas depois a execução ficou muito abaixo.
A tabela abaixo mostra como as taxas de execução do investimento público (o executado face ao previsto no OE) foram substancialmente mais baixas na legislatura 2016-2019 do que tinham sido anteriormente."
6 anos volvidos, o investimento público efectivamente executado de Passos Coelho, mesmo numa conjuntura de intervenção pela "troika", continua uma miragem inatingível para a esquerda.
E o investimento efectivamente executado no SNS só foi ultrapassado em 2019, em tempo de vacas gordas. Mais uma vez, Joaquim Miranda Sarmento explica:
"Houve que repor os cortes salariais do tempo de José Sócrates e que ainda estavam em vigor em 2015 (os do OE2011, que cortaram os salários entre 3.5% e 10%). E houve a redução das 40 horas para as 35 horas. Ou seja, um aumento de despesa que não se traduziu em mais capacidade hospitalar."
Talvez por isso em 2017 alertava um Homem de quem tenho saudades (o H "grande" é intencional).
Estrategicamente, Passos devia ter deixado que a situação horrenda das contas públicas tivesse consequências ainda mais sérias e prolongadas nas carteiras do eleitorado. Mais cortes nos salários, cortes nas pensões, greves na rua.
Uma vez no governo, ao ir mais além que o exigido, (e ratificado pelos restantes partidos do arco da governação numa "coisinha" insignificante chamada "memorando da troika", coisa que os socialistas preferem que não nos recordemos, afinal gostam de passar a ideia que foram eles que acabaram com a austeridade, e não que a causaram e aprovaram), foi ingénuo ao pensar que os portugueses valorizariam o emagrecimento do Estado e o fortalecimento das contas públicas, de forma honesta, competente e transparente.
Não compreendeu que neste país, quem elege governos são funcionários públicos e pensionistas, e que eles preferem continuar a receber o deles, mesmo que à conta de mentiras e cativações, como confessa Sérgio Sousa Pinto, no seu artigo "A direita não merece governar", a 08/09/2018, no Expresso:
"A um ano das eleições legislativas tudo aponta para uma vitória folgada do PS, que, a confirmar-se, será justa e inevitável. A direita, por seu lado, só poderá queixar-se de si própria. Às segundas, quartas e sextas denuncia a austeridade, que, alega, se mantém, embora disfarçada, por via da carga fiscal e do garrote financeiro aplicado aos sistemas públicos; às terças e quintas denuncia a irresponsabilidade das devoluções salariais e da reposição das pensões, que são a marca de água do ciclo pós-austeritário. Nos dias santos denuncia os níveis historicamente baixos do investimento público e a política de cativações de Mário Centeno; nos feriados civis congratula-se, contrafeita, com as metas alcançadas no controle do défice, depois de ter animado o ano orçamental com anúncios, entre o fúnebre e o festivo, de que as mesmas não eram atingíveis, ou de que estavam, por qualquer razão, comprometidas.
Deste acervo extraordinário de contradições, resultam, no entanto, consequências, além da incapacidade de prover aqueles que estão descontentes com o governo de uma qualquer teoria explicativa, convincente e coerente, sobre o que está mal e sobre o que constituiria a alternativa. Não é possível cativar uma maioria sem oferecer uma racionalidade, coerente e inteligível, à qual se possa aderir. O PS tem uma «narrativa» simples sobre a crise, sobre o fracasso da austeridade e sobre a possibilidade da sua superação sem quebra dos compromissos internacionais do país, actualmente cumpridos e ultrapassados em resultados orçamentais sem precedentes na segunda República.
As classes médias, flageladas pela tributação, não encontram na direita qualquer refrigério. Pelo contrário, temem que a misteriosa responsabilidade que o enigmático PSD de Rui Rio reivindica, combinada com a sua esplêndida auto-suficiência e inflexibilidade, signifique, de forma encriptada, um pré-anúncio de regresso aos impostos da era Passos, ou, pior ainda, aos cortes então efectuados e entretanto revertidos, acrescidos talvez daqueles que não chegámos a sofrer por interposição do Tribunal Constitucional. A classe média, com o seu sentido prático de betão armado, escolherá a sua autopreservação.
Os funcionários públicos e os pensionistas têm sido regularmente informados pela direita de que são uma «clientela» comprada pelo PS, uma reserva eleitoral egoísta e autocentrada, incapaz de discernir além dos respectivos «privilégios», indiferente à sorte da sociedade em geral, à sustentabilidade das contas e ao futuro económico do país. Escusado será dizer que, entre as penosas negociações com o governo do PS e a perspectiva de um governo PSD/CDS desejoso de acertar contas com eles, funcionários e pensionistas assinarão um contrato político sem termo com o PS.
A tragédia da direita, no seu labirinto, tem, no entanto, uma explicação simples: A sua grande meta programática é o equilíbrio orçamental, e o actual governo deixou-a à deriva e sem propósito. Até a direita dos negócios, que execra os socialistas com imoderada paixão, percebeu que o equilíbrio orçamental é um objectivo mais realista e credível com a neutralização da influência social do PCP no quadro de uma gerigonça. Vai, então, a direita política apresentar-se ao país em nome de quê ? Ainda não decidiu."
Daqui o pensamento de hoje, um provérbio português cujo autor não soube identificar:
"Atrás de mim virá, quem bom me fará."
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