Falta de profissionais nas TI faz disparar salários em Portugal
Faltam profissionais porque estamos na Era da Informação.
O Diário de Notícias diz que a falta de profissionais nas TI faz disparar salários em Portugal.
Faltam profissionais porque estamos na Era da Informação
Embora tenha sido abençoado com um ZX Spectrum+ na infância, com o qual nos divertíamos horas^H^H^H^H^Hdias a fio, a decisão de seguir uma carreira nas Tecnologias de Informação consolidou-se apenas no início dos anos 90, quando me apercebi que era contemporâneo da "era da informação", e que os processos industriais clássicos estavam a ser acelerados e optimizados precisamente pelo transístor, pelo computador, pela miniaturização e pela automação.
Sentia que o futuro iria passar por "ali", e que era lá o meu lugar, mas não fazia ideia do impacto que teriam na economia global as comunicações móveis, a Internet, a Web, a banda larga, a manipulação e armazenamento de informação, a desmaterialização dos processos, dos negócios (actualmente até das infraestruturas), e as redes sociais.
Volvidos 30 anos, confirmo o quão correcto foi esse sentimento: quando enumero aqueles que considero os actuais catalisadores da inovação, como o armazenamento de energia, automação, biotecnologia, comércio electrónico, computação na cloud, drones, exploração espacial, fintech, genética, impressão 3D, inteligência artificial, IoT - Internet of Things, media digital, mobilidade autónoma e como serviço, pagamentos electrónicos, robótica ou trabalho remoto, estou certo que nenhum deles seria viável sem a evolução que as TI tiveram.
A era da informação democratizou o acesso à informação, (excluindo naturalmente algumas geografias com regimes políticos bem conhecidos). Mais que uma aldeia global, o mundo tornou-se numa aldeia digital, onde qualquer um pode prestar serviços a outro sem limitações geográficas, (com essa necessidade ainda mais acelerada pelas restrições impostas pela pandemia COVID-19).
É portanto com naturalidade e satisfação que vejo tantos profissionais portugueses envolvidos nesta área, mas também com fundada preocupação sobre o "disparo" nos respectivos salários em Portugal, como documenta o artigo do Diário de Notícias acima referido.
O caso da 3GNTW, e outros casos que conheço
A esmagadora maioria dos nossos clientes são PME's - pequenas e médias empresas portuguesas, exportadoras bem sucedidas, mas, por vários motivos (a inépcia sendo provavelmente o maior deles), não conseguimos internacionalizar a 3GNTW.
Ao posicionarmo-nos em 2003 como consultores, técnicos, administradores de sistemas e e programadores de websites e lojas online à medida, não tínhamos "produto" próprio para exportar, físico ou imaterial. Construímos competência, experiência e reputação em cima de um modelo de negócios limitado, baseado em headcount, e quando quisemos invertê-lo não tínhamos recursos suficientes para o podermos fazer rapidamente, sem romper com as responsabilidades entretanto assumidas.
Houve (e há) ideias para produtos, serviços, plataformas, que não puderam ser colocadas em prática rapidamente, por não identificarmos investidores cuja agenda não nos causasse dúvidas. Fomos forçados a avançar com verbas próprias, com um ciclo de desenvolvimento naturalmente muito mais lento. Só agora, em 2021, será anunciada a primeira dessas plataformas.
Na prática isto significa que a 3GNTW é precisamente uma das denominadas "tecnológicas nacionais", referidas no artigo, que perdeu alguns dos seus "melhores talentos" porque "vende os seus produtos a preços nacionais", (no nosso caso, conhecimento * tempo). E mais difícil se torna quando a cultura de "fazer diferente" interfere com a eficiência e automação das operações, e com a capacidade de substituir rapidamente o colaborador.
Este cenário é partilhado por outras empresas do sector cuja realidade conheço bem, porque sempre soubemos semear parcerias e amizades em vez de concorrentes. Nesses casos, pela maior dimensão face a nós, e pela localização nos grandes "centros digitais" do país, Braga, Porto e Lisboa, a canibalização de talentos tem sido percentualmente maior.
Um amigo director de uma tecnológica análoga à 3GNTW uma vez disse-me: "Os nossos problemas são os mesmos que os teus. Só muda o número de zeros: tu perdes um colaborador, nós perdemos 10, tu pedes um financiamento, nós pedimos dez vezes maior. É igual."
O trabalho remoto (que já existia antes, mas que foi muito exponenciado pela COVID-19) abriu as portas dos profissionais de IT portugueses ao mundo, e poderá colocar as tecnológicas nacionais numa posição muito, muito difícil, se não se souberem adaptar rapidamente a esta realidade.
E o recrutamento noutras geografias (no artigo exemplifica-se o Brasil) pouco ajuda, porque esses novos recursos são extremamente voláteis uma vez enriquecidos com 1 ou 2 anos de formação e experiência.
O que fazer ?
Algumas medidas que implementámos ou estamos a implementar internamente, com o objectivo último de aumentarmos os lucros, e consequentemente a retribuição aos colaboradores:
Reorientação da empresa para um modelo de negócio não baseado em headcount - no nosso caso, de consultoria para exploração de plataformas SaaS - Software as a Service próprias;
Alienação ou outsource de áreas de negócio não core;
Mesmo nos negócios core, fomento de parcerias mutuamente vantajosas, em vez de tentarmos fazer "tudo" dentro de portas;
Aumento da eficiência operacional, automação, auto-aprovisionamento e auto-ajuda - afastamento das soluções à medida;
Aumento de preços, nivelado pelo rácio preço/qualidade/disponibilidade do mercado - em última análise o cliente final acabará sempre por pagar o aumento dos salários dos colaboradores, é a simples lei da oferta e da procura;
Selecção e priorização de clientes - servir primeiro os clientes que garantem maior rentabilidade, e os outros apenas quando há disponibilidade de recursos - nem todos os clientes interessam, um "bom" cliente tem que sentir a necessidade pelos nossos serviços, e ter a capacidade de os pagar.
Para além disso, havendo essa possibilidade, parece-nos bem o acesso dos colaboradores ao upside, ie, à distribuição de lucros.
Nota final: a experiência mostrou-nos que o "salário emocional" referido no artigo coloca-se a partir de valores de retribuição que infelizmente ainda não temos a possibilidade de praticar. Haveremos de lá chegar.
A legislação laboral é outra peça a mexer-se neste tabuleiro, e, para não variar, nada favorável às empresas: https://zap.aeiou.pt/linhas-futuro-laboral-teletrabalho-391540