A diversificação no investimento passivo na bolsa, rastreando um índice global.
ETF global, várias gestoras de fundos e várias corretoras.
A rentabilidade potencial de um produto financeiro é directamente proporcional ao seu risco. Mais risco: mais rentabilidade. Menos risco: menos rentabilidade, (em alguns casos resultando até em rentabilidade negativa, perdendo para a inflação).
Se desejamos a maior rentabilidade potencial associada ao investimento na bolsa, temos que aceitar com naturalidade o seu maior risco e devemos implementar estratégias que o minimizem. A melhor dessas estratégias é a diversificação.
O que é a diversificação?
A diversificação é uma estratégia que espalha o risco por múltiplos activos diferentes, e múltiplos veículos de investimento diferentes, numa tentativa de limitar a exposição aos riscos de qualquer um deles em particular.
Concentrar o investimento é concentrar o risco. Diversificar o investimento é espalhá-lo, ao investirmos em activos que estão sujeitos a tipos de riscos diferentes. Por exemplo, no mesmo portefólio podemos incluir:
Investimentos alinhados e contracíclicos aos ciclos económicos, reduzindo o risco económico;
Sectores diferentes da economia, reduzindo o risco associado a qualquer um deles em particular, (ex. energia, matérias-primas, indústria, consumo básico e discricionário, saúde, financeiro, tecnologias da informação, telecomunicações, serviços públicos, imobiliário, etc.);
Classes de activos diferentes, reduzindo o risco associado a uma classe em particular, (acções, obrigações, imobiliário, commodities, etc.);
Empresas diferentes, reduzindo o risco de negócio associado a qualquer uma delas em particular (ex. risco estratégico, regulatório, operacional e reputacional).
Para diversificarmos bem temos que olhar para o conjunto de investimentos na sua globalidade, e não como um conjunto de investimentos sem relação entre si.
Este artigo foca-se na diversificação a assegurar quando se investe passivamente na bolsa rastreando um índice global através de ETF’s de baixo custo, a estratégia que recomendo.
Ao investirmos passivamente, rastreando um índice global através de ETF’s de baixo custo, devemos diversificar países, moedas, sectores, indústrias, empresas, instrumentos financeiros e os intermediários no investimento.
1. A diversificação de países, moedas, sectores, indústrias e empresas
O MSCI World, índice global que recomendo rastrearem, é constituído à data de hoje por 1465 empresas de grande e média capitalização bolsista, com sede em 23 países, mas com operações por todo o mundo, garantindo exposição às moedas dos países onde essas empresas fazem negócio. Elas operam em sectores tão diversos como a energia, matérias-primas, indústria, consumo básico e discricionário, saúde, financeiro, tecnologias da informação, telecomunicações, serviços públicos ou o imobiliário.
Esta variedade de sectores faz com que algumas dessas empresas sejam alinhadas com os ciclos económicos, outras sejam contracíclicas, e outras ainda lhes sejam indiferentes.
Portanto, ao rastrear o MSCI World estamos automaticamente diversificados no que diz respeito a países, moedas, sectores, indústrias e empresas. Note-se, no entanto, que essa diversificação está longe de ser perfeita porque, por exemplo, o Dólar e os EUA representam cerca de 70% do índice.
2. A diversificação dos instrumentos financeiros
“Mas o MSCI World é um índice, como podemos investir num índice?”
Rastreando-o passivamente por meio de vários ETF’s acumulativos de baixo custo.
“ETF’s ? O que são ETF’s?”
Um ETF é um instrumento financeiro negociado em bolsa que corresponde a UP’s - Unidades de Participação de um fundo de investimento, gerido por uma gestora de fundos, que “rastreia” qualquer coisa: pode ser o preço de uma commodity, um conjunto de acções de determinada geografia, sector ou indústria, ou… um índice global como o MSCI World. No caso do MSCI World o fundo de investimento compra ou vende regularmente acções das empresas que constituem esse índice, na proporção da sua capitalização bolsista.
Se as acções de uma empresa subirem de valor, a sua capitalização bolsista (ie, o número de acções emitidas multiplicado pelo valor de cada acção) aumenta, e isso altera a posição da empresa no índice relativamente às restantes. O fundo de investimento compra ou vende mais ou menos acções das empresas incluídas no índice MSCI World conforme as suas flutuações nesse índice. O investidor compra UP’s - Unidades de Participação nesse fundo.
Denominam-se ETF’s acumulativos aqueles que “acumulam” os dividendos distribuídos pelas empresas cujas acções foram compradas pelo fundo de investimento subjacente ao ETF, no próprio fundo, aumentando o seu valor. Esta estratégia é mais eficiente fiscalmente do que a distribuição de dividendos a quem compra UP’s - Unidades de Participação dos ETF’s.
“Mas porque comprar vários ETF’s, e não apenas um?”
Porque a gestora de fundos responsável pelo fundo de investimento subjacente ao ETF pode falir. A diversificação de activos deve contemplar e mitigar esse risco, ao dividi-lo por vários ETF’s correspondentes a vários fundos de investimento geridos por várias empresas diferentes.
Por exemplo, as 5 maiores emissoras de ETF’s são a BlackRock, Charles Schwab, Invesco, State Street e Vanguard, podemos adquirir UP’s - Unidades de Participação de ETF’s que rastreiem o índice MSCI World de cada uma dessas empresas. Na remota possibilidade de uma delas falir, apenas 20% do nosso portefólio seria afectado.
A diversificação nos intermediários
Se uma gestora de fundos com milhões e milhões de Euros sob a sua gestão pode falir, então o que dizer do “pequeno” banco ou corretora através dos quais adquirimos as UP’s - Unidades de Participação dos ETF’s a adquirir?
A CMVM - Comissão do Mercado de Valores Mobiliários é a entidade cujo objetivo é supervisionar e regular os mercados de instrumentos financeiros em Portugal, bem como os agentes que nele atuam. A sua missão passa ainda por promover a proteção dos investidores nestes mercados.
O SII - Sistema de Indemnização aos Investidores é uma pessoa coletiva de direito público visando proteger os pequenos investidores e que funciona junto CMVM. Destina-se a cobrir os riscos de falência dos bancos ou corretoras. Assim, se de repente “desaparecerem” as ações que tinha em carteira, nem tudo está perdido. O SII protege parcialmente os investidores face a tais acontecimentos, devolvendo um máximo de 25000€ de capital investido em instrumentos financeiros (acções, obrigações, títulos de participação, UP’s em fundos de investimento) e até 100000€ de capital não investido.
Todos os reguladores na União Europeia implementaram medidas semelhantes de protecção aos investidores, com protecções a partir dos 20000€ para capital investido em instrumentos financeiros.
Face a esta realidade, podemos e devemos diversificar a carteira de investimentos sobre vários bancos ou corretoras, de forma usufruirmos da protecção do SII em cada uma dessas entidades, e a distribuirmos o risco por elas.
Exemplo prático de diversificação a 3 níveis
Imaginemos um cenário em que um investidor decidia rastrear passivamente o índice global MSCI World usando 3 ETF’s de 3 gestoras de fundos diferentes (no caso, Amundi, BlackRock e SPDR), e ia comprando UP’s - Unidades de Participação desses ETF’s para cada uma das suas 3 contas em 3 corretoras diferentes (ActivoBank, Degiro e Interactive Brokers):
Neste cenário, e no que diz respeito a problemas com alguma corretora, o investidor estaria completamente protegido até aos 25000€ (no caso das corretoras portuguesas) ou 20000€, no caso da Degiro. A partir desse montante, e assumindo que o investidor repartia os investimentos equitativamente pelas 3 corretoras, em caso de falência numa delas teria em risco apenas 33,33% do seu portefólio.1
No que diz respeito a problemas com alguma gestora de fundos, mais uma vez o investidor teria em risco apenas 33,33% do seu portefólio.2
Nota final:
As corretoras, ETF’s e gestoras de fundos acima indicadas foram escolhidas aleatoriamente apenas para exemplificar uma estratégia de diversificação no investimento passivo na bolsa, rastreando passivamente um índice global. Não constituem recomendação.
Note-se que eu não tenho conhecimento de qualquer caso em que os investidores tenham perdido as acções ou UP’s - Unidades de Participação em ETF’s, em caso de falência das suas corretoras, porque normalmente o regulador intervém e os activos simplesmente são transferidos para gestão por outra corretora.
Tanto as corretoras como as gestoras de fundos recorrem à custódia externa dos activos, de forma a que permaneçam segregados das suas contas, e protegidos em caso de falência. Não tenho conhecimento de casos de falências em gestoras de fundos em que os investidores não tenham visto os seus activos migrarem para outras entidades, ou serem indemnizados, se bem que existiram situações em que esse processo foi moroso.